Por que eu tenho tanta dependência afetiva dos outros?

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A dependência afetiva, inicialmente, pode ser gradualmente instalada na cabeça das pessoas, por figuras parentais ou de quem exerce o papel de cuidar de alguém. 

E esse processo acontece através de um cuidador que tem fortes traços narcisistas. 

Geralmente, as pessoas narcisistas gostam de ter bajuladores por perto. Esses, costumam exercer o papel de nutridores emocionais do ego narcisista alheio. 

E para o narcisista ter um bajulador sempre por perto, ele costuma desenvolver a estratégia da criação da dependência emocional do bajulador com relação à ele.

A dinâmica de interação que o narcisista deseja é ser endeusado sempre, para se sentir superior a todos (mesmo que não seja) e, assim, ter poder de controle sobre os outros, para conseguir o que se quer. 

Para isso, o narcisista costuma agir sempre buscando agradar esse outro de forma bem intensa. 

Esse movimento que o narcisista inicia é o bombardeio de “amor”, cujo objetivo é atrair o outro com iscas, tais como: elogios, reconhecimento público, carinho, presentes materiais, favores, conselhos, atenção, brincadeiras etc..

Se o narcisista, que bombardeia o outro com todas essas coisas boas, ficasse genuinamente feliz por somente ver o outro feliz e não exigisse nada em troca, isso seria uma atitude altruísta e não narcisista.

Porém, o narcisista vai buscar, de forma bem sutil e gradual, atuar para reverter a situação em benefício próprio.

O seu objetivo final será que ele esteja sempre no centro das atenções, que o outro se transforme em alguém que deverá sempre fazê-lo muita massagem no ego, servindo-o em tudo aquilo que ele quer ser servido.

A dependência afetiva se inicia dessa forma. Os narcisistas sabem que todos nós gostamos de carinho, elogio, valorização. 

No início de qualquer relacionamento, agem 100% assim, para fazer o outro acreditar que tem uma pessoa incrível por perto, capaz de fazê-la se sentir muito especial. 

A pessoa, geralmente por ser educada, acaba retribuindo as gentilezas que o narcisista faz por ela, fazendo de volta tudo o que for possível para ser recíproco e tentar agradar o narcisista pelo que fez por ela, no começo.

A atitude do bombardeio de amor do narcisista, acaba gerando apego em quem recebe tudo isso. O outro passa a desejar não mais perder essa pessoa tão “incrível”.

Aqui está a armadilha que o narcisista instala na cabeça do outro, pois essa generosidade toda tem objetivos secundários (e às vezes, bem sombrios).

O narcisista, sabendo que o afeto que ele dá é capaz de fazer a outra pessoa se mover para tentar agradá-lo, passa a usar seu próprio afeto como moeda de troca, para ter a capacidade de poder mandar e desmandar nos outros.

E isso acontece através da instalação do sentimento de culpa por seus atos: pela insinuação de que o outro fez algo errado (mesmo que não tenha feito) ou através do uso de pequenos erros cometidos pelo outro, com o exagero bem destacado deles e com muito drama emocional (como se fosse o pior crime do mundo).

O objetivo: fazer o outro se sentir culpado e ficar vulnerável, para atender vontades alheias.

Daí, o narcisista se torna mestre em criar contextos, em que o clima afetivo é de tensão ou chateação por algo feito pelo outro. A mensagem implícita comunicada é que o outro está fazendo o narcisista se sentir mal por algo que esse outro fez. 

Com isso, a pessoa que é colocada como errada (mesmo que não seja), passa a querer fazer de tudo para reparar o suposto erro, só para agradar o outro e ver esse outro feliz.

Só que o narcisista nunca vai estar feliz, pois o objetivo dele é exatamente esse: controle emocional alheio e manipulação afetiva.

A estratégia é essa: instalar na cabeça do outro a mentalidade de que ele deve ser uma pessoa perfeita, boazinha, e que tem o dever de fazer tudo aquilo que o narcisista quer para ele se sentir feliz.

O narcisista deixa sempre no ar, a seguinte mensagem: “se você fizer tudo perfeito como está na minha cabeça, se me agradar como eu gosto sem eu ter que falar como gosto, e se eu ficar feliz com isso; como consequência, vou decidir se você vai merecer o meu afeto como retribuição ou não.”

É aí onde mora o perigo.

Depois que se instalou na cabeça do outro a mensagem de que se deve fazer tudo para agradar (ser bonzinho), há quem se aproveite disso e faça, intencionalmente, o outro sempre se sentir mal e incapaz de agradá-lo: não importa o que o outro faça, sempre será exigido cada vez mais, sendo que nunca será bom suficiente para nutrir o narcisista. 

O motivo do narcisista agir assim não é para conquistar felicidade. É puro interesse egoísta de ter poder de manipulação sobre o outro, através do sentimento de culpa incutido, mediante qualquer atitude (boa ou não) que será sempre ruim e insuficiente aos olhos do narcisista. 

E é através da culpa que o narcisista vai tentar (e muitas vezes conseguir) manipular o outro a fazer qualquer coisa para tentar agradá-lo.

Para quem é vítima desse jogo psicológico, acaba sendo instalado com sucesso a dependência afetiva. 

Se essa dinâmica de interação for generalizada para as pessoas como um todo, isso vira carência com manifestação de reações emocionais intensas em relacionamentos.

Aquelas pessoas que se acham muito intensas, podem ser assim, porque foram criadas em um ambiente afetivo disfuncional descrito acima: o afeto como moeda de troca.

Isso gera nas pessoas um profundo desejo de criação de vínculos profundos e seguros, com alguém que não vai retirar esse afeto por motivos egoístas, só porque quer. 

E o problema de quem vive intensamente as relações sociais é que essas pessoas se entregam muito rápido para qualquer pessoa que se comporte de maneira bondosa com ela. 

Receber um elogio de alguém, já seria capaz de despertar nela o desejo de querer casar com quem a elogia.

Tudo isso acontece porque a pessoa ainda está dentro do papel de bonzinho/boazinha, querendo agradar a todos, para ter o afeto, o elogio e o reconhecimento de suas atitudes generosas.

E para sair desse papel, o principal exercício a ser praticado é aceitar suas imperfeições, não se importar em frustrar as expectativas do outro e conseguir desenvolver opiniões próprias sobre suas próprias atitudes manifestas.

O motivo de ter que se fazer isso é simples: exercitar o autocuidado. Você pode estar se perguntando: “mas como eu faço isso comigo mesmo?”.

E eu respondo te dizendo: faça o autoreconhecimento de suas próprias atitudes e limitações para si mesmo.  

A forma de se fazer isso é assim: sabe a capacidade que uma pessoa qualquer tem de te observar, dar nome para seus comportamentos manifestos, destacá-los e dar adjetivos positivos ou negativos a eles? Pois é. Você também tem essa mesma capacidade e nem precisa de um outro para fazer isso por você.

Através da auto-observação e da geração de opiniões e visões descritivas e realistas sobre seu próprio comportamento, você aprende a ter convicções e opiniões próprias e, de quebra, aprende a não ser refém de joguinhos psicológicos de narcisistas oportunistas.

Se ele tentar destacar seus erros para te incutir culpa, por você já tê-los observado, quando ele for falar sobre isso, o efeito sobre você será nulo. Ou seja, sua opinião sobre si mesmo te blindou de manipulações emocionais.

Igualmente sobre as relativizações que os narcisistas fazem de suas atitudes: se você tiver uma opinião própria formada e realista sobre si mesmo, qualquer distorção feita será passível de ser ignorada por ser absurda e você vai poder continuar sendo serenamente você.

Conseguir fazer esse exercício sozinho é bem possível, mas para alguns, isso pode ser um pouco difícil. Para conseguir com maior eficácia é sempre recomendado buscar alguma ajuda profissional ou aprender as ferramentas psicológicas para conseguir essa blindagem psicológica. Caminhando junto se vai mais longe.

Muitas pessoas vivem relações abusivas em contextos amorosos e familiares por muito tempo, pois não sabem como sair disso sozinhas. E esse tipo de atitude abusiva pode aparecer em várias outras esferas da sociedade. 

Ministros que agem como se estivessem acima da lei, partidos políticos com discursos cheios de distorções e mentiras, líderes religiosos que manipulam fiéis, professores que doutrinam, sem o outro poder manifestar o contraditório (com embasamento), relacionamentos amorosos em que o outro sempre está errado, relação familiar em que alguém é sempre o ruim, etc. 

Tudo isso não é mera coincidência, é total semelhança com o narcisismo mesmo. E é seu dever aprender a não deixar esse perfil de pessoa querer mandar e controlar tudo em sua vida: o que você pensa, como você sente e como age.

Para isso é fundamental que você aprenda a ser mestre de si mesmo para ser dono de suas próprias opiniões, sentimentos e ações para não ser manipulado(a) por ninguém.

Você sabe ser mestre de si mesmo(a)?

Escrito por Guliver Nogueira 04.11.2022

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